Rua de Mão Única, por Eduardo Augusto
Em entrevista à coluna editor Bruno Costa fala da importância de resgatar a obra poética de Lovecraft no livro Poemas de Horror Cósmico
O medo é um sentimento primitivo. Na literatura quando falamos de medo, um nome sempre se revela proeminente, Howard Phillips Lovecraft ou apenas H. P. Lovecraft, o mestre de todos nós.
Dono de uma produção vasta e de uma estética que veio renovar o gênero de horror cósmico e com misturas da literatura weird, sua escrita não se resume a contos e romances, tendo uma obra poética de grande relevância.
Dedicou parte de sua vida a uma escrita poética que dialoga com sua cosmologia. De Cthulhu ao ciclo dos sonhos, Lovecraft escreveu mais 300 poemas em sua carreira. É nessa poesia intensa que vemos seus flertes com o horror cósmico e tradicional. É possível observar, também, as homenagens aos mestres do terror como Edgard Alan Poe.
O leitor brasileiro terá, agora, a chance de conhecer essa faceta do Cavalheiro de Providence. Em campanha pelo Catarse, site de financiamento coletivo, a editora Ex Machina e a editora/sebo Clepsidra, trazem uma reunião dos poemas de Lovecraft na obra Poemas de Horror Cósmico.
O livro será encadernado em capa dura (o design da capa foi desenvolvido por Ricardo Ribeiro), totalizando cerca de 180 páginas (podendo chegar a cerca de 250 com as metas estendidas). A tradução ficou a cargo de Alexandre Barbosa de Souza, a preparação e a leitura crítica foram feitas por Felipe Vale da Silva e as metas estendidas ainda trazem a possibilidade de termos dois paratextos de estudiosos renomados da obra de Lovecraft: Caio Bezarias e Nathalia Sorgon Scotuzzi.
Além da reimpressão de outros títulos da chamada Biblioteca Fundamental Lovecraftiana, o leitor ainda pode adquirir ecobag e outros mimos.
Conversamos com Bruno Costa, editor da Ex Machina, que falou sobre a nova campanha, os poemas e o que espreita os leitores para o futuro.
Como nasceu a ideia da editora e por que uma editora de terror e fantasia?
A Editora Ex Machina, na verdade, tem uma linha editorial mais ampla: já publicamos poesia contemporânea, HQ, filosofia, crônicas, mas nos últimos anos temos nos dedicado à literatura fantástica em geral. A Editora nasceu depois da minha saída como sócio e editor na Hedra, de São Paulo, em 2013. O gênero fantástico é um dos mais interessantes e tem crescido exponencialmente nos últimos anos. Há muitas autoras e autores fascinantes nesse gênero ainda desconhecidos do público leitor no Brasil.
A editora tem feito um resgate dos autores que ficaram no esquecimento. Robert Aickman e Algernon BlackWood, são uns exemplos. Como se dá a curadoria desses autores?
Robert Aickman nasceu de uma conversa minha num café em Perdizes, com o meu amigo Oscar Nestarez, uma das principais vozes da pesquisa e da escrita de horror no Brasil. Nesse dia, acho que em 2017, descobrimos que estávamos lendo contos diferentes do Aickman, até então um autor desconhecido até mesmo dos estudiosos no Brasil. Estávamos fascinados com o estilo peculiar do grande autor britânico e a partir daí adquiri os direitos e resolvi publicá-lo. Nessa empreitada foi determinante o trabalho dos tradutores e pesquisadores que se envolveram no projeto: Ronaldo Gomes, Alcebíades Diniz, além de mim e do próprio Oscar. Além do estudioso britânico Philip Chalinnor. Foi um trabalho de fôlego, dificílimo, mas o resultado fez tudo valer a pena. Hoje o autor é lido e estudado no Brasil até por escritores, que buscam um estilo mais sutil para a elaboração do horror. O Blackwood só havia sido publicado no início dos anos 2000, em tradução competente da Heloísa Seixas, então resolvemos publicar um apanhado das suas melhores novelas, muitas inéditas por aqui. A curadoria, a seleção dos autores e obras é um processo longo e delicado e que envolve muita pesquisa e colaboração. Para o Aickman, por exemplo, lemos e avaliamos mais de 40 contos para selecionarmos nove. Muita coisa boa ficou de fora, mas esperamos fazer um novo volume em breve.
H. P. Lovecraft é um desses autores resgatados, tendo quase toda sua obra publicada pela Ex Machina. Como tem sido a recepção do público.
Ainda na Hedra desenvolvi uma coleção dedicada a ele. O diferencial era que as nossas edições tinham uma tradução cuidadosa e capas feitas sob encomenda. O tradutor Guilherme da Silva Braga, um dos mais brilhantes dessa nova geração, era o responsável por verter todos os títulos. Tulio Caetano criava a arte para as capas, belíssimas. A coleção representou um ponto de inflexão na bibliografia lovecraftiana no Brasil, por tratar o autor com o respeito que ele merece. A recepção foi positiva e imediata, pois os leitores mais atenciosos e curiosos estavam sedentos de boas traduções e aparatos críticos sobre o autor. A coleção tirou o autor do limbo no Brasil e estabeleceu um novo padrão para a publicação do Lovecraft no Brasil.
A plataforma de financiamento coletivo, Catarse, tem sido uma ferramenta fundamental para as publicações. Poderia nos falar um pouco como tem sido essa experiência?
O Catarse nos dá a possibilidade de alcançar o nosso público diretamente, de falar com ele e entender os seus anseios e necessidades, esse é o grande diferencial. Também nos permite ousar mais e publicar livros que as editoras do mainstream não tem coragem ou vontade de publicar. Nossas edições, por causa do financiamento coletivo, são muito mais completas e sofisticadas do que as edições das grandes editoras, por exemplo. No caso de Contos reunidos do mestre do horror cósmico, que já está na segunda edição revista e ampliada e já vendeu mais de 3 mil exemplares, basta comparar o sumário dessa obra com o das outras edições de Lovecraft no Brasil e você verá a abrangência do nosso trabalho, fruto do esforço de mais de uma dezena de colaboradores ao longo de quase uma década. No caso da Clepsidra, o catálogo de obras do Gótico não tem par no Brasil, é um trabalho de excelência em todos os sentidos. É o publico de apoiadores que nos permite fazer isso e a ele que devemos o sucesso das nossas edições.
A editora está com nova campanha na plataforma. A biblioteca lovecraftiana fundamental 2. Que traz, além dos livros já lançados Contos Reunidos, Os fungos de Yoggoth, e também o novo Poemas de horror cósmico. Conte para nós como foi o processo de escolha dos poemas e os processos que envolveram essa escolha.
A Biblioteca Lovecraftiana Fundamental é um projeto conjunto das editoras Ex Machina e Clepsidra que pretende reunir uma coleção das obras fundamentais do autor com a maior qualidade editorial possível. Já estamos na segunda edição da campanha, com novos títulos e reimpressões. Poemas de horror cósmico tem a curadoria de S. T. Joshi, nosso amigo e colaborador, e reúne os principais poemas de Lovecraft, além disso temos também a contribuição de especialistas e estudiosos brasileiros para aprofundar a análise.
Gostaria que comentasse um pouco sobre o poeta Lovecraft. Essa faceta do autor é pouco publicada?
Lovecraft começou a escrever poemas ainda na sua infância, portanto a relação dele com a poesia é visceral. Pouca gente sabe, mas o horror cósmico se manifesta primeiro na poesia dele. É esse lado que pretendemos apresentar ao público brasileiro.
O que os fãs podem esperar para as próximas campanhas?
Temos várias campanhas em andamento, em fase de pesquisa ou tradução. Convido a todas e a todos que acompanhem nossas redes sociais no Instagram para conhecer melhor nosso trabalho!
A obra de Lovecraft é maravilhosa. Muito bom que esteja sendo revisitada. Excelente matéria.