A Casa dos Gatos, por Jesuíno André
Somos um país de fartura. Indiscutivelmente fartura de riqueza para poucos e de pobreza para muitos. Assim determina o sistema econômico de plantão.
Maria é uma jovem senhora diarista que tem muita história para contar. Aos quarenta anos é mãe de três filhos e avó de três netos. Sofrimentos na vida: no amor, no trabalho e na família. Tudo combustível precioso para seu orgulho exibido.
Com o seu atual marido tem vivido a paz desejada. Ele é motorista e vem de uma família também humilde. Por causa de alguns traumas do passado, ela gosta de celebrar momentos importantes promovendo festas vistosas. O aniversário do marido, por exemplo, foi o recente feito e comemorado com um jantar especial.
Para tal, ela aprendeu a fazer uma iguaria ainda inédita aos seus dotes culinários: comida chinesa. A referida é um saboroso alimento conhecido mundialmente e bem popular entre a camada pobre nos países asiáticos.
Pois bem, o cardápio festivo seria carne chinesa! Um luxo de refeição diante do preço da carne e do arroz. A família dele foi convidada, obviamente, e é constituída pelo pai, mãe e duas irmãs. Maria caprichou no jantar fazendo com gosto e apuro o que tinha aprendido.
Mesa posta, convidados à mesa e olhares admirados voltados para o prato fumegante. O silêncio foi inusitado e cerimonioso. A água na boca juntou-se ao barulho dos talheres. Após o primeiro bocado, a cunhada mais nova da anfitriã rompeu a mudez da mesa com um suspiro longo e com a boca salivando, revelou maravilhada:
– Nunca imaginei que fosse comer uma carne chinesa!
A descoberta encantou a todos. Afinal é sabido que a moça, em companhia da mãe, diariamente, ao meio-dia, frequenta a fila do restaurante popular da cidade para o almoço dos miseráveis.
Nesta vida há os mais variados e elevados níveis de deslumbramentos. E cada qual com seu cada qual.
