A Casa dos Gatos, por Jesuíno André
Zezo é um sujeito humilde e calejado da vida. Baixinho, cabelos brancos, magro, com um rosto vermelho e castigado. Gosta de tomar umas. Mora perto aqui do prédio e todo dia pela manhã pega a sua velha bicicleta vermelha e segue para não muito longe; geralmente carrega a danada sem montá-la. Deve ser um cacoete. Quando sóbrio, sempre passa em frente à padaria e solta em direção aos donos uma saudação costumeira, com o seu surrado bordão:
– Ê Zé, tu tai bom? Ê Leo, tu tai bom?
Bastante popular na área, sempre o vejo sóbrio seguindo logo cedo na direção do boteco mais próximo no qual é freguês. Não guarda segredos do que faz. É conhecido por todos do seu gosto inquestionável pela cachaça. Mas cada qual com seus vícios, seus defeitos, suas virtudes.
Quando estive na padaria, me confessou que na época em que foi motorista de um importante diário local, tomava todo cuidado antes de dirigir o veículo da empresa. Logicamente, sem uma gota de álcool na boca. E foi mais longe no particular me dizendo que certa vez quase sofria um acidente quando levava sua neta na garupa de sua bicicleta.
– É uma neta linda que eu tenho. Ela é alta e bem bonita. No futuro me dará um bisneto. – concluiu todo vaidoso.
Depois disso, seguiu caminho levando a bicicleta a pé. Após certa distância se apruma no selim e pedala o destino. Mas os ponteiros do relógio correm pouco e algumas horas depois ele desponta no começo da rua, quando volta encharcado de álcool. Pela força do hábito, não precisa de muito para se embriagar. Vem lentamente, vagaroso, parando em certos lugares como se fossem estações de martírio – falando e esbravejando com suas sombras e seus pecados. Ainda assim é bafejado pela sorte, porque na rua movimentada de carros o perigo sempre passa ao largo.
Como de costume nos mesmos horários, cambaleante, retorna carregando a sua velha companheira de guerra com o maior cuidado possível. Ao chegar novamente à frente da padaria, que fica próximo da rua de sua casa, ainda dá tempo de confessar gritando:
– Ê Zé, Ê Leo, não tô enxergando nada. Eu tô bebo!
Sem demora, como num final de filme, dobra a esquina e segue seu destino. Zezo não faz mal a ninguém. Nem a ele e nem a uma mosca.