A Casa dos Gatos, por Jesuíno André de Oliveira
Do alto dos seus dois metros, Thilindão ficou impressionado com a quantidade e diversidade de passarinhos do Principado. Os ouvidos generosos estão acostumados com os belos cantos na exuberante natureza da sua Península de Itapagipe.
– Man, é muito passarinho nessa área aqui – disse olhando para as copas das árvores no Clube Cabo Branco enquanto atenta para os cantos diferenciados -, só aqui no momento tem mais de vinte.
– E é?
– Tem curió, sanhaço azul, sebito,… – desatou a enumerar as aves.
Ele adorou o fenômeno.
Semana passada no feriadão estive no pequenino mercado local e no fiteiro de Zezinho, que fica na entrada, conheci um grande artista. De aparência frágil como um passarinho, baixinho, de peso leve e cabelos lisos e pretos com a asa da graúna. De olhar sério e meio calado, mas bastou puxar conversa pra criar simpatia.
– Qual é o seu nome? – perguntei.
– Pode me chamar de Zezé – respondeu sem cerimônia.
– E que é que tu fazes? – lembrei-me do dito do Barão, onde afirmava que o homem não progredia sem dois defeitos: a curiosidade e a insatisfação.
– Sou motorista particular. Também gosto de compor e cantar.
– Cantar?! – fiquei surpreso.
– Isso mesmo. Tenho mais de cinquenta músicas feitas. Ainda ontem eu fiz duas músicas.
– E foi? Dê uma palhinha de uma – pedi desconfiando.
– “Ela me abandonou, me deixou e foi embora…” – cantou com excelente tom de voz e uma força de expressão marcante no rosto e nas mãos.
– Muito bom! Isso é música sertaneja tradicional.
– É o meu estilo! – disse com o brilho nos olhos e emendou – Veja essa aqui: “Ontem eu acordei, sozinho na minha cama, você partiu e nem avisou…”
Ensaiei umas palmas e balancei a cabeça em aprovação.
– Rapaz, vou confessar uma coisa, sua voz é melhor do que a de Chitãozinho e Chororó! Parabéns!
– Muito obrigado! – abriu um sorriso.
– Agora me diga uma coisa, o tema das suas canções é de sofrimento e de perda. O que lhe inspira a compor desse modo?
– O amor pela minha mulher! Separei que vai fazer dois anos e eu senti muito – confessou com certa angústia.
– Me desculpe perguntar, mas por que ela lhe deixou?
– Ciúmes! Muito ciúme de minha parte.
– Após quanto tempo de casado?
– Tinta anos!
– Rapaz, depois de trinta anos de casado você ainda era ciumento com sua mulher?!
Percebi que ele emudeceu. Depois soube que passou por uma depressão profunda e ainda se recupera do fato.
– Permita-me a liberdade, mas de hoje em diante vou lhe chamar de Zezé de Miramar, pode ser?
– Mas claro! Agradeço a você pela atenção em saber que sou um compositor e ouvir um pouco da minha música.
Lembrei-me de uma frase do filósofo Emil Cioran: “a música é o refúgio das almas feridas pela felicidade”. E cada cantar ao seu modo, seja pássaro, seja gente…